Lucía Méndez
Enfermeira, Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga
1. As Doenças pulmonares intersticiais (DPIs) são, por norma, doenças muito graves. O que lhe traz energia, motivação e esperança para gerir e ajudar os doentes com DPI?
As doenças pulmonares intersticiais englobam um grupo heterogéneo de doenças que partilham características clínicas, radiológicas e histológicas. Têm um impacto elevado na qualidade de vida dos doentes, pois são doenças altamente incapacitantes com graves consequências físicas e emocionais que afetam não só o doente, mas também a sua família. A sobrevivência média estimada pode ser entre 3 e 5 anos, dependendo da doença subjacente.
O exercício da profissão da enfermagem implica o respeito pela dignidade humana, a liberdade e a singularidade de cada pessoa sem distinção. A profissão de enfermagem é uma profissão exercida por vocação e, como tal, implica um sentimento interior de dedicação, que é a verdadeira motivação de todos os enfermeiros, e também a minha.
A gestão das doenças pulmonares intersticiais é sempre complexa. Os cuidados podem ser direcionados para a prevenção ou educação para a saúde no tratamento farmacológico e não farmacológico da doença, mas especialmente para o alívio do sofrimento, sendo a identificação precoce do sofrimento especialmente importante. Quando falamos de sofrimento, é importante salientar que estamos a falar não só de sofrimento físico, mas também de sofrimento emocional ou espiritual. É por isso que cada relação enfermeiro-doente é especial e única.
O que me traz esperança é a oportunidade de acompanhar os pacientes e as suas famílias nesta parte da sua jornada de vida, a fim de proporcionar a melhor qualidade de vida possível e de aprender com cada experiência, com cada doente, o que me ajuda a melhorar constantemente as minhas competências de enfermagem.
2. Que conselho daria aos futuros enfermeiros sobre como lidar com a componente emocional associada ao acompanhamento de doentes impactados com doenças graves, como estas?
As doenças pulmonares intersticiais são doenças crónicas. Enquanto condições médicas de longo prazo, incuráveis e potencialmente progressivas, o processo começa muito antes do diagnóstico, com o aparecimento dos primeiros sintomas que são simultaneamente intrigantes e preocupantes para os doentes. Contudo, quando após inúmeros testes e consultas médicas, se chega a um diagnóstico, este provoca normalmente no doente e na sua família sentimentos de angústia, tristeza, impotência, raiva e medo, o que causa um grande stress emocional nas famílias que é difícil de gerir. À medida que a doença progride, a autoestima dos doentes diminui, devido à sua incapacidade para o trabalho e atividade física, mas também pelo facto de se sentirem um fardo para as suas famílias. Estas situações favorecem o isolamento, e sentimentos de solidão e incompreensão. A relação enfermeiro-doente é essencial. A comunicação eficaz entre os dois é uma estratégia fundamental. É importante validar as suas emoções, sentir tristeza, raiva ou medo é válido e cada doente tem um determinado tempo para assimilar a sua situação. A exteriorização das emoções deve ser encorajada, não sendo recomendável esconder ou reprimir as emoções. Esta expressão pode ser feita de várias formas: falando, escrevendo ou com ajuda profissional mais especializada. Acima de tudo, devemos encorajar e promover que aproveite e aprecie a sua vida, mesmo que pareça contraditório. É evidente que a doença causa graves limitações, mas é importante que o doente não sinta pena da sua situação; vivendo, agradecendo e valorizando o que tem. Enquanto a doença o permitir, deve promover atividades que goste de fazer com a família ou amigos, mesmo que tenha de o fazer de uma forma diferente. Devemos também ter em mente que cada pessoa é diferente e, portanto, a reação emocional a certas situações é diferente em cada indivíduo, pelo que o cuidado será sempre individualizado.
Por outro lado, as exigências emocionais dos pacientes e das famílias podem gerar um elevado nível de stress nos enfermeiros. Em geral, a profissão de enfermagem gera elevados níveis de stress, uma vez que a procura contínua e constante de cuidados por parte dos doentes, especialmente aqueles com doenças crónicas incuráveis, as longas horas de trabalho por turnos, os recursos limitados e a disponibilidade limitada de descanso, provocam um esgotamento físico e emocional nos enfermeiros que necessita de ser gerido. A identificação de ferramentas que nos ajudam a gerir este stress é muito importante. Procurar o que se adequa à nossa vida e personalidade: atividades desportivas e de lazer, técnicas de relaxamento, leitura... todas aquelas estratégias que ajudam a reduzir o stress e contribuem para o nosso enriquecimento pessoal. A normalização dos sentimentos que sentimos em situações stressantes é também importante - falar sobre sentimentos e emoções é uma forma de ajudar. É recomendável procurar o bem-estar emocional, pois é tão importante como o bem-estar físico.
3. Ao longo dos anos, certamente que a experiência lhe trouxe ensinamentos sobre como ajudar estes doentes a lidar com as suas emoções e perspetivas perante a doença. Poderia partilhar o que já aprendeu?
Uma das coisas que se aprende ao longo dos anos é que a empatia é uma componente central da relação entre enfermeiro e doente e tem demonstrado influenciar positivamente a gestão da doença. Quando falo em empatia, refiro-me à competência sócio-emocional para compreender a situação, perspetiva e sentimentos do doente. Pode ser difícil responder com empatia ao sofrimento emocional porque, por vezes, podemos sentir-nos desconfortáveis com emoções fortes, seja porque estamos demasiado concentrados noutras tarefas para reconhecer as emoções à medida que elas ocorrem, seja porque sentimos que não há tempo suficiente para responder. Cuidar de doentes com doenças crónicas, tais como doenças pulmonares intersticiais, envolve uma grande dificuldade emocional: muitas vezes, vemos no doente a vulnerabilidade das nossas próprias vidas ou dos nossos familiares, ao mesmo tempo que tentamos gerir a situação da melhor maneira possível para o doente. Mas não podemos esquecer que a figura do enfermeiro constitui um apoio fundamental para o doente e família, em todas as etapas da doença, mas especialmente na parte final da vida. É nesta fase que a relação de confiança que se estabelece vai além de uma mera atenção clínica, pelos estreitos vínculos afetivos que se estabelecem e a abordagem integral que a enfermagem proporciona.
4. Como é a interação e quais são os pontos de comunicação mais relevantes quando se lida com cuidadores e familiares?
Nós, enfermeiros, somos os profissionais de saúde que passamos mais tempo com os doentes, pelo que a comunicação enfermeiro-doente é fundamental no processo de cuidado. As capacidades de comunicação são uma competência essencial na nossa profissão. Quando um doente exige cuidados de saúde, espera também ser ouvido, e a missão do enfermeiro é abordar todas as necessidades de cuidados, desde os cuidados físicos aos emocionais. Assim, uma boa comunicação é extremamente importante para oferecer cuidados de enfermagem de qualidade. É essencial encorajar a escuta ativa e responder às perguntas, fornecendo informação clara, apropriada e precisa em todo o momento. A escuta ativa implica mostrar interesse no que os doentes têm a dizer, reconhecer que estamos a ouvi-los, compreender e envolver-se durante toda a conversa. Por outro lado, o silêncio deliberado pode dar, tanto ao enfermeiro como ao doente, a oportunidade de pensar e processar o que vem a seguir na conversa, assim como dar espaço para abordar um novo tópico. É necessário aceitar o que o nosso doente nos está a dizer (que não é o mesmo que concordar com ele) dando espaço para a reflexão.
É também importante compreender as idiossincrasias de cada pessoa e de cada família, adaptando esta comunicação a cada realidade. Num mundo cada vez mais cosmopolita, não podemos esquecer que é necessário compreender as diferenças culturais e religiosas para assegurar uma comunicação eficaz.
A linguagem não verbal é a base fundamental da comunicação na enfermagem. É tão importante o que é dito como a forma como as coisas são ditas. Portanto, a forma como a informação é transmitida, a postura, a expressão facial e o tom de voz são fundamentais para a comunicação. Olhar nos olhos, especialmente na realidade atual com uso de máscaras, e o contacto físico entre enfermeiro e doente fornece muita informação.
A comunicação não é tão fácil como parece. A comunicação é complexa e influenciada por muitos fatores e, por esta razão, nós, enfermeiros, devemos procurar constantemente a melhoria das nossas capacidades de comunicação.